Submetida ao fogo intenso e solitário do sofrimento interior eu só aprendi, aprendi, e aprendi ...
Sou Damaris Flor, nasci em Recife na década de 50, filha de um dos casais fundadores da Igreja de Cristo Pentecostal no Brasil, o Pastor evangelista Mário Pedro e sua esposa Maria Flor, uma mulher guerreira, de muita fé e agregadora da nossa grande família. Meu ponto de apoio para enfrentar desafios da sobrevivência.
Minha história pessoal se confunde com a história da minha profissão...
Na década 1960 meus pais se separaram e a carência afetiva e financeira invadiu minha família, contudo não perdi a motivação pela escolaridade. E aos dez anos estava no quarto ano primário dominando a leitura, a escrita e as operações fundamentais.
Aqui minha história pessoal se confunde com a história da minha profissão. Inspirada na minha inesquecível e amada professora Graubem Lucíola de Paula comecei a brincar de professora em casa, depois em escola comunitária e mais algumas décadas tornei-me profissional da educação até a presente data. Até parece letra de música porque no início era apenas uma brincadeira e foi crescendo, crescendo e me absolvendo e de repente me vejo assim completamente entregue a neuroeducação.
A relação foi desastrosa e tremendamente difícil...
Na década 1970, já possuía quase uma década de experiência em sala de aula com alfabetização. Concluí o magistério no Colégio Evangélico Agnes Erskine com a ajuda emocional, financeira e orientação da minha inesquecível companheira de turma e amiga - A professora, escritora e pianista Dinilza Buarque de Gusmão juntamente com seu saudoso esposo Doutor Aristófanes Câmara Moreira pelos quais tenho imensa gratidão. Ainda nesta década casei-me e tive um filho e duas filhas. A relação foi desastrosa e tremendamente difícil porque havia me casado com um jovem comprometido emocionalmente com diagnóstico de psicopatia, TOC e personalidade esquizoide. Durante uma década vivi mergulhada num cenário de violência psicológica e moral. Porém, o pior ainda viria. E em meio a esse pandemônio ainda ingressei no curso de pedagogia da Universidade Federal de Pernambuco.
Aprendi a me “desprofessorar” e transformar minha sala de aula em laboratório de aprendizagem...
No início da década 1980, após nossa separação, meu ex-marido sequestrou meus 3 filhos que tinham respectivamente, 9, 5 e 4 anos de idade. Durante 8 longos anos fiquei sem contato com meus filhos. Eu não os vi crescer! E experimentei a perda da maternidade. A pior experiência que vivi. Caminhei entre a loucura e a sanidade. Meu mundo interior despencou neuroquimicamente e eu só pensava em morrer. Foi aí que aprendi a transformar fezes em adubos. Uma experiência que me modificou radicalmente. Submetida ao fogo intenso e solitário do sofrimento interior, eu só aprendi, aprendi e aprendi... Aprendi a identificar e utilizar alavancas da força interior. Aprendi a não ser piegas, a ser útil, laboriosa, criativa, produtiva e resiliente. Aprendi a compreender mais, a amar muito, a perdoar independente de pedido de perdão ou da mudança do agressor. Aprendi a me perdoar, a ser chorona, a rir de mim mesma e ser bem-humorada. Aprendi a ser sensível ao choro de criança, a apatia ou rebeldia do jovem e do adulto. Ainda na década 1980, fui admitida em concurso como professora do Ensino Fundamental das redes municipal e estadual de Pernambuco e também aprendi a me “desprofessorar” e transformar minha sala de aula em laboratório de aprendizagem pra mim e para os meus alunos. E nesse ínterim, aprendi a ser indutora e animadora do processo de aprendizagem. Aprendi a mediar a aprendizagem no paralelo da ergonomia do funcionamento do cérebro e assim criei o Método de Alfabetização Damaris ou Caminhos Diferentes para Alfabetização. Reaprendi amar e entrei perdidamente apaixonada no segundo relacionamento com Valdomiro Lopes da Silva, um amigão, sindicalista, politizado que faleceu muito cedo. Com ele aprendi a me envolver nas discussões políticas do meu país. E aprendi a ser ouvidora e terapeuta cognitiva comportamental na prática para ajudar pessoas que como eu necessitava identificar a força interior que temos. Na Faculdade de Filosofia do Recife, como palestrante a respeito do processo de alfabetização, conheci minha amiga–irmã e companheira de estudos e pesquisas, a Mestre e professora Terezinha Augusta Pereira de Carvalho e seu saudoso esposo Doutor e professor Lupércio Pereira de Carvalho. Com eles aprendi a sair do senso comum e adentrar no senso cientifico. Meu interesse pela educação crescia e como havia demonstrado pioneirismo ao criar um método de alfabetização com fundamentos neurocientíficos, dediquei-me ao estudo de sua fundamentação por mais de uma década. Ingressei na Fundação de Ensino Superior de Olinda. Tornei-me uma eterna estudante, aluna assídua em inúmeros cursos de extensão e capacitação e simultaneamente me tornei pesquisadora da educação. Sistematizei cursos, projetos palestras, livros e servi ao meu estado e ao meu país, atravessando suas fronteiras para apresentar trabalhos científicos.
Juntos enfrentamos muitas derrotas e conquistamos inúmeras vitórias e continuei aprendendo...
Na década 1990 reencontrei meus filhos literalmente invadidos pela carência afetiva e financeira. Tomada pela emoção do reencontro e da vulnerabilidade de meus filhos chorei compulsivamente. E aquele "manhinha pernambucano" habitual dos meus filhos eu não ouvia mais. Meus amigos deram uma festa para comemorar a chegada deles, mas uma sensação de perda dos filhos pequenos e a obrigatoriedade de aceitar e conquistar os que haviam crescido era um grande desafio. Mais uma nova batalha foi travada para restabelecer nossos laços maternos e nossa inclusão pessoal, familiar e social. Não foi fácil... Até hoje sofremos as sequelas dessa catástrofe familiar. Mas dialeticamente em meus filhos reencontrei mais uma alavanca emocional pra mover meu mundo e juntos enfrentamos muitas derrotas e conquistamos inúmeras vitórias e continuei aprendendo...
O filme do passado de dor e conquista passava em nossas cabeças...
Nos anos 2000, em meio a todo esse arsenal de emoções, tornei-me escritora e lancei dois livros. No dia do lançamento do meu livro Caminhos Diferentes para Alfabetização no Grande Hotel em Recife nossa famíla se entreolhava e o filme do passado de dor e conquista passava em nossas cabeças e chorávamos juntos. Um amigo me falou espantado - Se eu soubesse que a família era tão chorona eu tinha trazido um rodo para puxar as lágrimas, mas nós sabíamos por que chorávamos. Predeterminada a sobreviver continuei aprendendo como leitora sem fronteiras. Aprendi a ser estudante apaixonada pelas neurociências e busquei o diálogo entre a neurociência e a educação. Nesta mesma década conheci a Ex-Vereadora Luciana Azevedo e sua assessora Mirian Pires que me conduziram à Fundação Joaquim Nabuco e à Universidade Federal de Pernambuco. Nesta universidade conheci Luiz Gustavo Cordeiro da Silva, professor da UFPE e coordenador do Laboratório Virtus desta universidade. Fui convidada por ele para integrar o time do referido Laboratório durante três anos dando continuidade aos estudos e pesquisas em neuroeducação, neurodidática e neuroalfabetização orientada por esse meu grande amigo e professor e com ele aprendi muito. Aprendi sobre as peculiaridades de artigo, pesquisa e estado da arte das ciências e nesse ínterim, ganhei um revisor, crítico e orientador dos meus estudos e pesquisas fato que não encontro palavras para agradecer. Também encontrei ajuda exponencial no Excelentíssimo João Arraes, Vereador da Cidade do Recife, que vem contribuindo para a continuidade dos meus estudos e pesquisas. E para finalizar quero agradecer a toda minha família pelo seu papel estruturador no meu cotidiano. E agradecer a todos que não foram aqui mencionados, mas se colocaram na construção da minha vida e minha história. Diz-se que nossos ideais precisam de 99% de pessoas externas para que eles se materializem. É verdade!
Uma ousadia sem medida para demonstrar nosso desejo de contribuir com o projeto educacional do nosso século, através da neurociência...
Em 2012, juntamente com Terezinha Augusta, publiquei o Livro Neurociência para Educador pela Editora Baraúna. Uma livro compilado de estudos e pesquisas de grandes neurocientistas. Este livro é uma ousadia sem medida para demonstrar nosso desejo de contribuir com o projeto educacional do nosso século, através da neurociência.
Atualmente sou consultora educacional, escritora e conferencista. Esta é a síntese da minha história de mil fracassos e incontáveis conquistas.
29-02-2012
Damaris Flor