O aprendizado das emoções - Professor: Arnie Vikan - Aluno: Gilberto João Pavani - Pós-Graduação em Informática na Educação - gjpavani@ez-poa.com.br
Porto Alegre – 1999
Estudos demonstram que os bebês têm uma habilidade inata para reconhecer o significado de algumas expressões emocionais básicas e que a expressão facial destas emoções é constante nas diferentes culturas humanas. A habilidade de produzir este reconhecimento universal da expressão facial é também inata. Recém-nascidos produzem diferentes expressões faciais semelhantes às expressões de adultos em situações similares.
Um estímulo particular provoca automaticamente uma reação emocional que, no caso do bebê, é demonstrada através da expressão facial sem a necessidade de algum saber ou imitação.
A criança não só guarda o sinal da expressão emocional de um adulto, como também presta atenção em algo que lhe é indicado. Os bebês começam a reconhecer as expressões emocionais em outra pessoa através da atenção seletiva. Esse paradigma leva em consideração o fato de que eles prestam mais atenção em coisas novas comparadas com alguma coisa que tenham visto antes. Desse modo, os bebês podem ver uma diferença entre uma expressão emocional e outra, só faltando comunicar o significado que eles associam à expressão.
A expressão emocional das mães tem um papel direto na interação com a criança, guiando suas reações em relação ao mundo que a circunda. A expressão facial dos adultos serve como sinal que ativa ou suprime todo o sistema exploratório, tendo um efeito seletivo. Experimentos mostram que as crianças apreciam objetos específicos aprovados pela expressão facial de sua mãe.
Observa-se um modelo padrão de desenvolvimento das emoções presente na maioria das crianças. Contudo, existem características individuais que as diferenciam em relação à compreensão de suas emoções. As experiências emocionais das crianças variam. Dois fatores parecem especialmente capazes de produzir variação: a experiência emocional da própria criança e o ambiente que ela enfrenta em casa. Algumas crianças precisam aprender a lidar com a separação constante de um ou de ambos os pais, ao passo que outras não os têm. Algumas precisam viver continuamente em um ambiente tenso, enquanto outras têm alguma fonte de alegria. Em casa, as crianças podem ser confrontadas com uma atmosfera predominantemente feliz ou raivosa. As famílias também diferem. Elas variam na forma como as emoções são expressas – a raiva pode ser suprimida e silenciada, ou pode ser evidenciada e explosiva. Elas variam também no favorecimento das estratégias de controle das emoções – alguns pais ignoram ou repreendem uma criança infeliz; outros tentam distraí-la; e outros tentam sanar a dificuldade. Essas variações da experiência emocional na vida em família são determinantes na compreensão das emoções pelas crianças.
Levando-se em conta que as crianças aprendem a enfrentar as situações da vida com os pais, se esses enfrentam os seus problemas – econômicos, sociais e emocionais – com violência, a conduta da criança em situações similares às vividas pelos pais será idêntica. Crianças violentas têm, certamente, uma história de violência na família. Crianças fortemente ameaçadas em casa são retraídas e têm um medo exagerado. Crianças que sofreram abuso sexual têm um comportamento auto-destrutivo.
Abaixo, relata-se alguns casos em que o comportamento agressivo da criança na escola tem sua origem no tratamento recebido em casa:
1) Maurício – 9 anos
Maurício está há 3 anos na 1a série do 1o grau. Seu comportamento na escola é agitado e agressivo. Bate nos colegas e não respeita os professores. Apresenta dificuldades de aprendizagem. O menino é filho do primeiro marido da mãe, que já está separada pela segunda vez. A mãe é agressiva e violenta. Várias vezes, ela bateu nele com as grades do fogão porque ele pediu comida. Ela foi denunciada para o Conselho Tutelar, com o qual fez um acordo de que se batesse novamente no filho, perderia a sua guarda.
2) Juliana – 11 anos
Juliana se prostituiu. Na escola, bate nos colegas que tentam uma aproximação. Já engoliu um alfinete como forma de provocação aos professores e tem um grampo preso na parede do esôfago. Não tem estrutura familiar. Mora com a mãe, que é paraplégica e de quem contraiu Aids.
3) Marcelo – 12 anos
Marcelo não respeita os professores. Tem baixo rendimento escolar, pois se nega a executar as tarefas propostas. Bate nos colegas. Em casa, seu pai bate em toda a família com fio de luz e depois faz os filhos ficarem com o corpo mergulhado em um tonel de água fria para que não fiquem marcas e não ser denunciado ao Conselho Tutelar
4) Paulo – 10 anos
Paulo apresenta problemas de crescimento, com sinais visíveis de nanismo. Na escola, não é agressivo, mas é dispersivo. Está há 3 anos na 1a série do 1o grau. A mãe da Paulo bate nele porque ele não sabe ler e diz que ele é burro. A própria mãe relatou que picotou uma cartilha e fez uma "sopa de letrinhas", obrigando o menino a comer papel por não haver conseguido ler.
Nas classes sociais mais baixas, essa realidade é muito comum, mas não somente nelas. Paulo Freire falava há alguns anos atrás da "pedagogia da fome"; hoje, pode-se falar de uma pedagogia da violência. Diante de casos como os acima relatados, é difícil não se sensibilizar e se questionar sobre a possibilidade de recuperar crianças como essas, vítimas de adultos emocionalmente doentes, que terão uma forte tendência a repetir o seu comportamento, gerando filhos também violentos.
Como transformar o comportamento de pessoas com estratégias inadequadas de enfrentamento de problemas? Essa pergunta deveria nortear uma pedagogia que, além de estudar a melhor maneira de ensinar conteúdos escolares, também se preocupasse com as questões emocionais. Que condições psicológicas de aprender a ler e a escrever tem uma criança que é espancada? Quem deve receber assistência? Os pais, a criança, ou ambos? O ideal seria tratar pais e filhos, proporcionando-lhes atendimento psicológico e esclarecimento através de palestras, e mostrando-lhes desse modo uma nova perspectiva de vida. Para aumentar as chances de reeducação, seria importante o encaminhamento para uma atividade produtiva para que essas pessoas se sentissem úteis e aumentassem sua auto-estima, nesses casos muito baixa.
No entanto, na maioria dos casos, os adultos se negam a realizar qualquer mudança e muitas vezes não têm nem mesmo a consciência de que o seu comportamento esteja errado, pois também foram criados dessa maneira. Portanto, se não é possível tratar a família, é importante mostrar pelo menos à criança que ela poderá se reestruturar e construir uma vida mais feliz e produtiva, através do uso de estratégias adequadas de regulação das emoções. Segundo Piaget, o objetivo da educação é a autonomia do ser.
Para uma compreensão completa da emoção, a criança precisa ter a capacidade de separar o seu pensamento das características objetivas de uma situação. O impacto emocional de uma situação é determinado através da avaliação subjetiva de uma pessoa sobre a situação – uma avaliação (de)formada pelas suas crenças, expectativas e desejos. Para se compreender as emoções de alguém, basta tomar a si mesmo como uma estrutura de referência. A capacidade da projeção imaginativa ajuda tanto o adulto quanto a criança a tomar a perspectiva de outras pessoas, permitindo que ela raciocine sobre os seus próprios desejos e crenças.
Freqüentemente, toma-se o conhecimento como guia do comportamento emocional. No entanto, nem sempre se está ciente dos determinantes cognitivos relacionados ao comportamento emocional. As razões freqüentemente giram em torno de construções post hoc que se usam para justificar as reações emocionais imediatas.
Muitos dos modelos emocionais são considerados modulares, programas comportamentais organizados, executados em resposta a situações específicas. Foge-se de situações assustadoras, agride-se quando alguma coisa ou alguém desperta a cólera, e aproxima-se dos eventos agradáveis. Assim, as respostas programadas são executadas automaticamente. Não obstante, pode-se desfazer o programa através da construção do objeto da atenção.
Para aprender a regular de forma adequada as emoções não basta adquirir conhecimento sobre o sistema emocional, é preciso enfrentar os problemas e buscar soluções. O monitoramento do self pode igualmente inibir as ações e tendências primárias. A distração e a conversa também podem ser maneiras de regular as tensões.
A emoção é uma perturbação aguda do indivíduo como um todo, que o faz se sentir dominado. Adultos e crianças descrevem as emoções como um processo involuntário e autônomo que os toma de surpresa.
Para estar consciente de quando uma emoção ocorrerá e de quando controlar é necessário, é preciso usar vários tipos de conhecimento: conhecimento sobre os antecedentes da emoção, conhecimento sobre os sinais para identificar uma emoção em si mesmo em um primeiro estágio, conhecimento sobre a falta de controle da emoção, e conhecimento sobre as conseqüências das ações desse modelo para si mesmo e no comportamento.
Através da construção de estratégias adequadas de regulação das emoções, pode-se inibir a execução automática de um programa emocional. Isso reforça a importância do monitoramento de si mesmo, uma vez que dá o tempo e a oportunidade para lidar com as emoções.
Um dos mecanismos mais eficazes para modificar a expressão de uma emoção é a reavaliação cognitiva da situação. A chegada a uma conclusão adequada pode ser descrita como uma constante ação combinada entre avaliações cognitivas, emoções, subsequentes informações processadas, avaliações e assim por diante.
Na vida cotidiana, a escolha de um modelo é freqüentemente racional e fortemente relacionada com as restrições de uma situação. Pode-se considerar três principais categorias: impedimento ou supressão de uma resposta emocional, modificação de uma resposta, e modificação do próprio estado emocional.
As crianças podem não saber descrever suas estratégias de controle das emoções em palavras. Embora sejam capazes de fazer uso de estratégias de controle quando incitadas ou impelidas, isso não quer dizer que elas as usem também espontaneamente. Mesmo que possuam uma estratégia de controle para as suas emoções, elas nem sempre percebem que deveriam ou poderiam exercitar esse controle.
As crianças dificilmente codificam o programa emocional fixado que se verifica em sua expressão, pois a codificação da própria experiência emocional requer um processamento cognitivo. Por isso, é de suma importância a presença de um adulto junto à criança para que ela consiga mudar suas estratégias de regulação das emoções. Esse adulto pode ser da família ou da escola, que muitas vezes se vê obrigada a solucionar problemas oriundos da fragilidade ou inexistência de uma estrutura familiar.
O que é necessário para que uma pedagogia contra a violência se concretize? Pesquisas junto às escolas? Suporte financeiro para que as escolas contratem profissionais especializados? Possibilitar que os próprios professores se especializem, visto que um trabalho desse porte deve ser realizado por pessoas preparadas para tal?
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